Como esse livro nasceu
Eu sempre quis escrever. Sempre gostei de explicar as coisas de um jeito que fizesse sentido, que chegasse claro aos ouvidos de quem ouve e aos olhos de quem lê. Talvez seja uma necessidade antiga, essa de organizar o caos em palavras, de traduzir o que sei em algo que outra pessoa possa carregar consigo. Durante anos, imaginei que escreveria um livro simples — didático, direto, funcional. Um livro sobre ovulação, sobre folículos, sobre as definições básicas da medicina reprodutiva. Algo útil, mas sem muita alma.
Com o tempo, percebi que esse livro não poderia ser apenas isso. Não poderia ser um manual técnico, frio, distante. Ele precisava se tornar outra coisa: uma síntese de anos de observação, uma jornada pessoal e científica ao mesmo tempo. Porque o que eu tinha para dizer não cabia em definições. O que eu tinha para dizer nasceu de perguntas que fiz no silêncio dos consultórios, nas madrugadas de plantão, nos momentos em que olhava para os exames das minhas pacientes e sentia que algo estava faltando. Algo que ninguém estava vendo.
Esse livro não nasceu de um insight súbito. Ele nasceu de uma obsessão lenta, crescente, quase involuntária. Nasceu da minha tendência de procurar padrões onde outros veem apenas dados isolados. Nasceu do meu hiperfoco — essa coisa de olhar para a mesma pergunta por todos os ângulos possíveis, até que ela se revele por completo. Foram anos de reflexão. Anos de anotar dúvidas, de revisitar teorias, de desconfiar de respostas prontas. E então, em algum momento, as coisas começaram a se encaixar.
A fascinação pelos padrões
Desde sempre, fui fascinada por conexões. Por aquilo que não está explícito, mas que pulsa por baixo da superfície. Talvez seja por isso que me tornei médica — não apenas para curar, mas para entender. Para decifrar. A medicina reprodutiva me atraiu exatamente por isso: ela é cheia de mistérios. Cheia de perguntas sem resposta. Cheia de mulheres que fazem tudo certo e, ainda assim, não engravidam.
Comecei a observar tudo com uma lente diferente. Cada exame de sangue, cada ultrassom, cada ciclo que não resultava em gravidez — tudo isso virou material de investigação. Eu não conseguia aceitar as explicações convencionais. "É assim mesmo", diziam. "Às vezes não funciona", diziam. Mas eu não conseguia me conformar. Tinha que haver algo que estávamos deixando passar.
Observação
Anos olhando os mesmos dados de formas diferentes
Conexão
Buscando padrões invisíveis nas histórias clínicas
Questionamento
Desconfiando das respostas prontas
Esse hiperfoco me levou a lugares inesperados. Comecei a anotar pequenas dúvidas — o que minha avó chamaria de "pulgas atrás da orelha". Coisas que incomodavam, mas que eu ainda não sabia nomear. Por que o endométrio de algumas pacientes não respondia? Por que os níveis hormonais pareciam adequados, mas a fertilidade não vinha? Por que o FSH subia em algumas mulheres jovens, como se o corpo estivesse gritando por algo que não conseguíamos ouvir?
O caos antes da clareza
O processo de descoberta foi caótico. Durante anos, senti como se estivesse juntando peças de quebra-cabeças diferentes, sem saber se elas se encaixariam. Coletava ideias, teorias, dados, dúvidas. Tudo parecia importante, mas nada parecia suficiente. Eu voltava sempre às mesmas perguntas, mas por caminhos diferentes. Lia artigos científicos, relia protocolos clínicos, conversava com colegas, observava minhas pacientes. E a sensação era de estar andando em círculos.
Mas os círculos, percebi depois, não eram inúteis. Eles eram necessários. Porque foi nesse movimento circular, nessa repetição obsessiva, que as coisas começaram a se assentar. Depois de tanto tempo olhando para o mesmo problema, algo mudou. A confusão deu lugar à clareza. E o que antes parecia complexo e inalcançável, de repente, parecia tão simples que qualquer um poderia ter visto.
"Nada é realmente difícil de entender. Nós apenas não olhamos para isso por tempo suficiente." — Einstein
Essa frase se tornou meu mantra. Porque era exatamente isso que eu sentia. Não é que a verdade fosse obscura — ela estava ali o tempo todo. Nós só não tínhamos olhado com a paciência necessária. Não tínhamos dado ao problema o tempo que ele precisava para se revelar. E quando finalmente olhei por tempo suficiente, a resposta apareceu, tão óbvia que cheguei a rir sozinha. Como é que ninguém tinha visto isso antes?
Mas sei por quê. Porque a ciência, às vezes, se apaixona por suas próprias complexidades. Porque gostamos de explicações elaboradas, de protocolos sofisticados, de tecnologias de ponta. E, no meio disso tudo, esquecemos de olhar para o básico. Esquecemos de perguntar: o que o corpo está tentando nos dizer?
O chamado por significado
A conversa com Deus
"Deus, não é possível. Tem alguma coisa que a gente não está enxergando."
O sofrimento das pacientes
Mulheres fazendo tudo certo, seguindo todos os protocolos, e ainda assim sem respostas.
A intuição persistente
O problema não era o método. Era a compreensão. Algo fundamental estava faltando.
Houve muitos momentos de frustração. Momentos em que eu olhava para os exames de uma paciente que tinha feito tudo — todos os tratamentos, todas as tentativas — e ainda não conseguia engravidar. E eu pensava: isso não pode ser apenas azar. Isso não pode ser apenas "é assim mesmo". Tem que haver uma razão. Tem que haver algo que não estamos vendo.
Foi nesse lugar de desconforto, de inquietação genuína, que comecei a conversar com Deus. Não de um jeito formal, litúrgico. Mas de um jeito cru, quase desesperado. "Deus, me ajuda a enxergar. Mostra o que está faltando. Porque essas mulheres estão sofrendo, e eu não consigo aceitar que não haja uma explicação." E, de alguma forma, senti que essa conversa foi ouvida. Porque as respostas começaram a chegar — não de uma vez, não de forma dramática, mas aos poucos, como pequenas luzes se acendendo no escuro.
Percebi que o problema não era a tecnologia. Não eram os protocolos. O problema era que estávamos olhando para a fertilidade de um jeito fragmentado. Estávamos medindo hormônios, contando folículos, avaliando embriões — mas não estávamos vendo o fluxo. Não estávamos entendendo que a fertilidade não é uma soma de partes. É uma dança. E essa dança precisa de um maestro. Sem esse maestro, tudo desafina.
O começo do reconhecimento de padrões
Foi então que comecei a colecionar as "pulgas atrás da orelha". Cada dúvida pequena, cada pergunta sem resposta, cada caso que não se encaixava no esperado — tudo isso virou combustível. Anotei. Reli. Revisei. E percebi que essas pequenas dúvidas, quando colocadas lado a lado, formavam um padrão.
01
As mudanças endometriais
Por que o endométrio de algumas pacientes simplesmente não respondia aos tratamentos hormonais?
02
Os padrões hormonais
Por que mulheres com FSH alto e AMH baixo ainda podiam, às vezes, engravidar naturalmente?
03
As perguntas sobre AMH e FSH
Por que esses marcadores, tão reverenciados, falhavam em prever a fertilidade de forma confiável?
04
A peça que faltava
E se o problema não fosse a quantidade de folículos, mas a qualidade do estímulo hormonal que os guiava?
Cada uma dessas dúvidas, uma a uma, me levou mais perto do estradiol. Não o estradiol que medimos no exame de sangue como um número isolado, mas o estradiol como princípio organizador. Como o maestro da sinfonia reprodutiva. Como o fluxo que, quando presente, faz tudo funcionar — e quando ausente, faz tudo desmoronar.
Comecei a ver que não estávamos tratando a infertilidade. Estávamos interrompendo o fluxo natural do corpo e tentando substituí-lo por protocolos artificiais. E, claro, às vezes funcionava. Mas muitas vezes não. Porque estávamos indo contra a natureza, em vez de trabalhar com ela. Estávamos tentando forçar a fertilidade, em vez de restaurá-la.
O encontro com Louise Brown
E então aconteceu algo que mudou tudo. Eu conheci Louise Brown. A primeira bebê de FIV do mundo. O encontro foi breve, mas simbólico de uma forma que só fui entender depois. Louise não foi a primeira tentativa de fertilização in vitro. Ela foi a primeira que funcionou. E por quê? O que havia de diferente naquela tentativa?
A resposta me atingiu como um raio: Louise foi a primeira FIV sem indução de ovulação. Patrick Steptoe e Robert Edwards não usaram hormônios para hiperestimular os ovários de Lesley Brown. Eles trabalharam com o ciclo natural dela. Deixaram o estradiol agir como deveria. E foi isso que fez a diferença.
Percebi que Louise não é apenas um marco histórico. Ela é uma metáfora. Ela representa o retorno ao equilíbrio. A ciência, naquele momento, não estava tentando controlar a natureza — estava colaborando com ela. E o resultado foi um milagre que mudou a medicina reprodutiva para sempre. Mas, ironicamente, depois de Louise, a medicina seguiu outro caminho. Um caminho de hiperestimulação, de protocolos agressivos, de controle hormonal intenso. E, no processo, perdemos o que havia funcionado na origem: o respeito ao fluxo natural do estradiol.
Louise me ensinou algo profundo. Ela me ensinou que a fertilidade não é sobre forçar o corpo a fazer algo que ele não quer. É sobre restaurar as condições para que ele faça o que já sabe fazer. É sobre devolver o fluxo. E o fluxo, percebi, sempre foi estrogênico. Sempre foi o estradiol. Ele estava lá o tempo todo, sussurrando a resposta. Só precisávamos parar para ouvir.
A realização do propósito
Foi nesse momento que entendi: eu não estava escrevendo apenas um livro. Estava construindo uma linguagem. Uma forma de ver a fertilidade que não existia antes. Uma forma de entender o corpo feminino não como uma máquina que precisa ser consertada, mas como um organismo vivo que precisa ser ouvido.
Este livro se tornou uma síntese de tudo o que observei, de tudo o que intuí, de tudo o que aprendi com as mulheres que atendi. Ele nasceu da compaixão pelo sofrimento delas. Nasceu da frustração de vê-las passar por tratamentos dolorosos, caros, invasivos — e ainda assim sem resposta. Nasceu da certeza de que precisava haver um caminho melhor. Um caminho mais gentil. Um caminho mais verdadeiro.
Observação
Anos de prática clínica, olhando além dos números
Intuição
A coragem de confiar no que via, mesmo sem prova imediata
Compaixão
O desejo profundo de aliviar o sofrimento das mulheres
Não é um livro sobre infertilidade. É um livro sobre restauração. Sobre devolver ao corpo aquilo que ele perdeu. Sobre ver a vida através da lente do estradiol — não como um hormônio qualquer, mas como a força que organiza, que conecta, que permite. O estradiol é o que faz o endométrio florescer. O que amadurece os óvulos. O que prepara o útero. O que sinaliza ao corpo que está tudo pronto para a vida começar.
E quando esse fluxo é interrompido — por estresse, por protocolos inadequados, por uma medicina que não escuta — a fertilidade desaparece. Não porque o corpo seja incapaz. Mas porque ele não tem as condições necessárias. Porque o maestro foi silenciado.
Ciência e fé
A ciência me ensinou
  • A observar com rigor
  • A questionar dogmas
  • A buscar padrões reprodutíveis
  • A documentar cada achado
  • A não aceitar respostas fáceis
A ciência me deu o método. Me deu a disciplina. Me deu a linguagem para traduzir o que via em conceitos que pudessem ser compartilhados, testados, validados. Sem a ciência, tudo o que eu observava seria apenas intuição vaga. Seria apenas sensação.
A fé me ensinou
  • A confiar no invisível
  • A escutar o silêncio
  • A respeitar o mistério
  • A ter paciência com o desconhecido
  • A acreditar que há propósito
Mas a fé me deu algo que a ciência sozinha não poderia dar: a coragem de seguir em frente quando tudo parecia incerto. A fé me deu a convicção de que havia uma verdade esperando para ser revelada. E que, se eu continuasse buscando, ela se mostraria.
Este livro nasceu dessa síntese. Ciência e fé não são opostos. São complementares. A ciência sem fé é fria, mecanicista, incapaz de enxergar o todo. A fé sem ciência é etérea, imprecisa, incapaz de se comunicar. Mas juntas, elas formam algo poderoso. Algo transformador. E é dessa união que este livro vive.
Das pulgas às epifanias
Olhando para trás, vejo que cada pequena dúvida — cada "pulga atrás da orelha" — foi essencial. Nenhuma delas era insignificante. Todas elas, juntas, formaram o caminho que me trouxe até aqui. E percebi que a descoberta científica não acontece de forma linear. Ela não acontece em laboratórios assépticos, com hipóteses claras e experimentos controlados. Ou melhor, ela até pode acontecer assim. Mas não foi assim que aconteceu comigo.
Para mim, a descoberta foi bagunçada. Foi cheia de idas e vindas. Foi cheia de noites em claro, de conversas comigo mesma, de anotações rabiscadas em cadernos, de insights que vinham no meio de uma consulta, de perguntas que eu fazia em voz alta e que meus colegas olhavam com estranheza. Foi um processo vivo. Orgânico. Humano.
1
As primeiras dúvidas
Anos 2010-2015: Observando casos que não se encaixavam
2
A coleta obsessiva
2015-2018: Documentando padrões, anotando exceções
3
O momento de clareza
2018-2020: As peças se encaixando, o estradiol emergindo
4
O encontro com Louise
2021: A confirmação simbólica e histórica
5
A decisão de escrever
2022-2024: Transformando observação em linguagem
E as epifanias? Ah, as epifanias vieram sempre quando eu menos esperava. No meio de um exame de ultrassom. No meio de uma conversa com uma paciente. No meio da noite, quando eu acordava com uma ideia que não conseguia esperar até a manhã para anotar. As epifanias não são eventos isolados. Elas são o resultado de um acúmulo lento, quase imperceptível, de compreensão. E quando finalmente chegam, sentimos como se sempre soubéssemos. Como se a resposta sempre estivesse ali, esperando que a gente a reconhecesse.
Um manifesto, não um manual
Este livro não é um manual. Não é uma receita. Não é um protocolo que você possa seguir passo a passo e garantir resultados. Seria desonesto da minha parte fingir que é. Porque a fertilidade não funciona assim. Ela não é previsível. Ela não é controlável. Ela é misteriosa, complexa, profundamente individual.
Mas este livro é um manifesto. É uma declaração de que podemos fazer melhor. De que precisamos olhar para a fertilidade com mais respeito, com mais humildade, com mais escuta. É uma declaração de que o corpo feminino não é uma máquina quebrada que precisa ser consertada, mas um organismo sábio que precisa ser apoiado. É uma declaração de que o estradiol importa — não apenas como um número no exame de sangue, mas como o princípio organizador de toda a fertilidade.
Este livro é para quem busca entender, não apenas tratar
Para quem quer ir além dos protocolos e enxergar o corpo como ele é: vivo, inteligente, conectado.
É para quem não se contenta com "é assim mesmo"
Para quem acredita que sempre há mais a descobrir, sempre há mais a aprender, sempre há mais a ouvir.
É para quem sente que a fertilidade é mais do que números
É fluxo, é ritmo, é dança. E o estradiol é o maestro dessa sinfonia.
Este livro nasceu de anos de observação. De ciência e fé. De pulgas e epifanias. De frustração e esperança. De perguntas sem resposta que, aos poucos, encontraram sua voz. E agora ele está aqui, nas suas mãos. Não como verdade absoluta, mas como convite. Um convite para olhar a fertilidade de uma forma nova. Para restaurar o fluxo. Para ouvir o que o corpo tem a dizer.
Bem-vinda ao ESTRO.NOW. Bem-vinda a uma nova forma de ver a vida.